Confira o relato da pedagoga, após formação na região da Itália que é referência para primeira infância
Por Lisa Santana*
A criança é um sujeito potente, dotado de direitos e deveres, com capacidade de expressar o que pensa e sente por meio de diferentes linguagens. Por isso, precisa fazer parte de uma atmosfera educativa que a acolha em sua singularidade e, ao mesmo tempo, seja capaz de valorizar a pluralidade presente em uma sala de aula.
Complexo, não é mesmo? Foi com esse pensamento que concluí a International Study Week, numa oportunidade incrível de troca e aprendizagem com quase 500 educadores de todo o planeta. O encontro aconteceu na pequena cidade italiana de Reggio Emilia, localizada na Emilia Romana, onde, há aproximadamente 60 anos, teve início uma bela história de luta em defesa da educação.
A Segunda Guerra Mundial havia acabado e deixou dolorosas marcas pela Europa. Em Reggio Emilia, a situação era precária: espaços públicos destruídos, escolas abandonadas, cidadãos ávidos por um recomeço, por um novo tempo. Nesse contexto, um grupo de moradores decidiu que a melhor maneira de vislumbrar um futuro próspero seria através da construção de uma escola, com as próprias mãos.
Fazendo uso dos detritos deixados pela guerra, começou a ser erguida uma creche, que chamou a atenção de um jovem pedagogo que passava pela rua e, que, posteriormente, faria história no cenário educacional italiano e mundial: Loris Malaguzzi.
Inspirado pelas ideias de Piaget, Vygotsky, Dewey e Montessori, Malaguzzi tornou-se uma referência para a comunidade educativa de Reggio Emilia, ao defender a ideia que a criança possui cem linguagens e, para desenvolver-se plenamente, precisa ser respeitada e escutada em suas diversas manifestações, desde muito pequena.
A criança é feita de cem
“A criança tem cem mãos
cem pensamentos
cem modos de pensar
de jogar e de falar.
Cem sempre
cem modos de escutar
de maravilhar
e de amar“
Loris Malaguzzi (1920-1994)
As crianças, seus direitos e suas cem linguagens
Investir na formação de um professor que seja capaz de ouvir sensivelmente o que traz o seu aluno, é tão importante quanto capacitá-lo a ensinar o que sabe. Valorizar o conhecimento trazido pela criança é, portanto, um importante passo para auxiliá-la em assimilações mais complexas.
A partir dessa compreensão, as escolas de Reggio Emilia foram ganhando uma identidade própria, autêntica e eficaz. Hoje, percebem o aluno como um sujeito ativo no processo de aprendizagem e, portanto, cabe ao professor assumir uma postura mediadora entre a criança e o conhecimento, oportunizando-a o protagonismo necessário ao seu desenvolvimento nas esferas social, afetiva e cognitiva.
Atrelada a essa conduta, está a parceria constante com as famílias desses alunos, convidadas a participar ativamente de momentos importantes da vida escolar de seus filhos, sobrinhos e netos.
Hoje é referência mundial em educação infantil, acredito que a lição que Reggio Emilia dá às escolas das mais variadas localidades é a seguinte: invista na formação docente, pois o conhecimento é dinâmico e nunca paramos de aprender. Incremente o espaço onde a criança estuda, porque com este a criança também se desenvolve.
Por fim, mas não menos importante: acredite no imenso potencial da criança; valorize o saber trazido por ela; tenha especial atenção por cada gesto e expressão; dê a ela a possibilidade de ser ela mesma, construindo uma imagem de confiança e afeto sobre si mesma. Se esses objetivos forem alcançados, então, a escola terá sido exitosa em sua missão.
Para conhecer mais a filosofia reggiana, visite: www.reggiochildren.it
Lisa Santana* (Pedagoga, vice-diretora da escola Casa do Horto – Educação Infantil Bilíngue)
Fotos: Divulgação. Foto Abertura: Escola com projeto arquitetônico premiado na cidade de Guastalla, na Reggio Emilia. Crédito: Moreno Maggi